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segunda-feira, 18 de setembro de 2017

OLUAP de Marcelo Mafra

ARFAM E OLUAP

Na cidade de São Paulo, especificamente na Praça da República, Arfam cirandava nos arredores pensativo e omisso aos fenômenos que bailavam sobre a atmosfera sensível. Parecia que tinha sido abduzido por um mundo paralelo completamente inteligível ao olhar alheio.
Uma voz tenra adentrou nesse “mundo” quebrando todo um protocolo assinado por sua estadia, era como se ele estivesse hospedado num hotel cinco estrelas, mas que poderia alcançar as estrelas apenas com o alavancar de seus braços. Os sentidos eram como guardiões justapostos a portaria que delimitava o sensível do inteligível, mas deveras não fora eficaz a voz que prosseguia. Arfam recebe finalmente, como se fosse um trovão conhecido apenas no “mundo” sensível, uma descarga elétrica sobre todos os sentidos que o faz retrogradar a orla desse devaneio metafísico. Já imune dessa “jornada”, percebe que o mundo invólucro é uma paisagem corriqueira aos sentidos e, que a voz transcendente, era o elo de seu abrupto retorno.
Ainda extasiado, Arfam sacoleja a cabeça de forma vertical como um samurai sua espada sobre a atmosfera ensaiando um simbolismo de advertência. A visão – a princípio pitoresca – lhe mostrava uma gama de cor completamente surrealista, onde apenas a forma transcendia uma possível identidade ao sentido. Cirandando no ataúde das lembranças, seguia retesando, revirando e descartando o que não lhe parecia se adequar a forma. Era como o “jogo da memória” onde só se poderia ganhar se encontrasse a figura igual. De tanto vasculhar, Arfam finalmente encontra o par nesse “garimpo da memória” e a forma denotava ser de um homem; isso bastou para que seu aguçado e domesticado juízo desvelasse e inserisse uma série de qualidades até poder reconhecer o produto final nos corredores e nas prateleiras do inconsciente. Embora ele fosse um grande pensador descompromissado com esse mundo dos signos pré-estabelecidos, não podia fugir por completo dessa teia tecida pela “história” dos vencedores de outrora.
Já com forma, qualidades, acidentes e gênero, mas ainda um espectro na identidade do tempo. Seu pensamento outrora turvo começa a se organizar de forma dialética “homem; estatura mediana; silueta delgada; cabelos ralos; olhos castanhos; pele enrijecida; braços truculentos; pernas torneadas;” na divagação dialética Arfam obteve todos os dados possíveis para se identificar um gênero, mas para desvelar a “mítica” daquele ente era preciso mais que psicofísica. Ele não conseguia penetrar essa barreira “metafísica” que lhe traria a veracidade dessa pessoa. Depois de ter folheado todos seus “álbuns de figurinhas”, estava convencido de que aquela pessoa não fazia parte de suas favoritas. Talvez fosse apenas um dos “pacotes” de figurinha desdenhado? Quem se lembraria dos pacotes? Pensava. Mas sua saga só prosseguiu pelo fato de ser fidedigno ao emaranhado que o fado apregoou.
O homem misterioso tomando consciência de que talvez não estivesse sendo reconhecido por Arfam, irrompeu sua boca e seus lábios do descanso que mais se assemelhava a um mausoléu tácito e inóspito e rechaçou mais um trovão, mas agora cúmplice de um relâmpago arrebatador e esclarecedor. Era como uma ponte de um castelo que por um motivo era fomentada a submergir ao solo e desobstruir a única passagem para adentrar aquele castelo de significado; podiam-se ouvir as correntes de seus nervos serem tangidas pelas mãos da vontade. Um batalhão de palavras arraigava-se inerte sobre a ponte e por ordem da razão se arremessaram sobre uma guerra improvável. Então de forma paradoxal a mascara é absolvida do seu papel oriundo, mas ainda espelhava um homem mascarado para Arfam depois de ter falado:
- o senhor poderia responder algumas perguntas? Disse o enigmático homem.
- só se você me responder várias – sussurrou de forma que só ele pudesse ouvir – apresente-me sua indagação e analisarei se possível. Responde desconfiado Arfam.
- meu nome é Oluap? Disse.
- o meu continuou o mesmo! Ressaltou.
Esse primeiro contato com as palavras desencadeou uma série de duvidas hiperbólica sobre a identidade do “homem Oluap”, mas essa identidade era um psitacismo ao ataúde de Arfam. Pensara que pudesse ser um parente desconhecido ou um amigo da época de faculdade, mas um manto lhe era tecido pelas agulhas do obscurantismo.  Sem outra saída, continuou o diálogo.
- acho que não estou sendo tão claro a respeito de minhas intenções e de minha identidade, estou certo? Pergunta.
- tão certeiro como o arqueiro vendado que irrompeu a maça sobre a cabeça de sua amada camponesa que, por milímetros escapara da ausência do labor, mas que ganhara a presença da incerteza! Conjectura o pensador.
- meu nome eu já lhe disse e a única coisa que busco é efetuar uma pesquisa sobre o vício. Trabalho para o governo e não me lembro de ter lhe visto mais gordo ou mais magro; só quero respostas para a pesquisa, se ainda for possível. Termina Oluap.
- bem, acho que nesse caso os fins justificaram os meios! Mas por ser um tema de grande importância e uma “preocupação” do governo, ficarei honrado em responder e, de certo, não tenho nada melhor a fazer! Responde.
- o quê acha dos viciados da “Cracolândia”? Perguntou.
- acho que são viciados. Respondeu.
- acho que não entendeu, o que quero dizer é o quê pensa a respeito de estarem se viciando diariamente? Pergunta novamente.
- penso que se viciam diariamente. Responde.
- quero apenas que me responda o que é o vício e por que ele deteriora o corpo e a mente humana? Pergunta Oluap com uma entonação já ríspida.
- acho que agora começamos a esboçar uma trilha sobre esse assunto que tem se arraigado no dorso dos pobres e excluídos de uma sociedade formadora de opinião favorável a si mesma! Responde.
- que bom que sairemos do “lugar”! Murmurou Oluap.
- há aqueles que proferem que o vício é os grilhões dos desprezíveis; há aqueles que proferem que os grilhões é o vício dos aprazíveis. Parece-me que o prazer é apenas uma membrana que camufla sua identidade veraz. É como a placenta que potência sua razão de existir, mas que é abruptamente rechaçada ao se romper como se fosse um amontoado de excremento. Desde os romanos o vício é associado ao prazer; agora associado ao “neguinho” da Cracolândia! Desde os gregos o vício é sinônimo de decadência. Mas a questão é quem era o ferreiro que manipulava o ferro abrasador? Quem carregava essa anátema aferroada em suas frontes e por que os ferroava? A primeira resposta era os aristocratas; a segunda era o vulgo entregue a destemperança de uma vontade egocêntrica que nem a mercê do tempo os deixava; a terceira era por que tinham que manter a “justiça” que se camuflava de poder aprazível a uma determinada casta. Faz-me lembrar de uma época... ah, a nossa época! Mas agora não mais pergunto; agora lhe afirmo. A arena romana era palco de homens gladiadores por um motivo; no coliseu as olimpíadas gregas eram efetuadas por um motivo, pois uma ação necessita de um motivo: apresento-te o vício camuflado de prazer! O algoz trazia em si seu vício sádico destemperado e ativo sobre o vulgo. Quantas guerras foram insurrecionadas por esses cultivadores do pernicioso vício sádico e unilateral? Ai negreiro dos meus antepassados! Cracolândia...  hemisfério dos excluídos!
Por que dizer que jogos como o (futebol), por exemplo, é um vício que tem dois gumes? Pelo motivo da estrutura e disponibilidade de seus praticantes: exercícios físicos, independente de sua estrutura anatômica; treinos exaustivos, independente de sua disposição; anseio de ser o melhor competidor por fins lucrativos, independente dos meios. Há um vício também que dignifica o homem por respeitar sua autonomia, ou seja, controlável pelo próprio sujeito; por exemplo, ainda no futebol: praticar exercícios físicos respeitando sua anatomia; treinar mediante sua vontade; busca até ser o melhor, não por enriquecimento, mas apenas para satisfação do ego – como uma mulher que recebe um galanteio, uma rosa, um abraço abrasador, ou até, o reconhecimento das tarefas de casa; vê no esporte uma forma de extravasar e de satisfação. Há inúmeros vícios, mas o que sentencio como pernicioso é o vício da opressão: engendrado a cada dia nas veias da sociedade.
Vemos caro ouvinte que todos nós somos viciados em alguma coisa: o jogador em futebol; o corredor em corridas; o amante na paixão; o filósofo em questionar; o escritor em escrever, embora haja exceções; o pintor em pintar; o chocólatra em chocolate etc.; Mas não podemos nos convencer do discurso retórico dos (sádicos psicopatas) de que tudo é fruto do vício: a faxineira não faz faxina por ser-lhe aprazível, mas porque não vê outra forma de subsistência; o trabalho espoliador não é aprazível ao trabalhador; o cortador de cana não corta cana de forma homicida a si mesmo por ser viciado em cortá-las, mas novamente por não vê outra saída à fome que se alastra e a inércia do proprietário. Esse é o outro gume do vício que mencionei há pouco: usa o diploma como seringa, as idéias como vírus e o povo como cobaia!
Quando vejo um viciado em craque e um viciado em pílulas para emagrecimento, a única diferença é que o primeiro rouba ou vende-se para a compra da droga para saciá-lo e, assim transcender sua realidade; o outro passa seu cartão de crédito e, ao comprar sua droga na drogaria para saciar-se, mas também busca uma “fuga”. Temos dois viciados quase análogos, mas incompatíveis economicamente e metafisicamente: o primeiro busca uma transcendência ao inteligível se desvinculando efetivamente do plano físico que só lhe oferece como médico o próprio alter ego, a repulsão e a chave para essa transcendência metafísica; o segundo busca um distanciamento temporário das pessoas que lhe avacalha e descrimina moralmente, mas busca ser medicado por renomados especialistas de Oxford, pois é no próprio plano físico ou sensível, que irá ostentar a razão de se drogar e a entrada para o “clube da luluzinha”.  O primeiro sofre a marginalização, a perda de identidade, a dissociação moral, a exclusão social e a perseguição. O segundo também perde, mas diferente do primeiro, só sofre a discriminação estética de um paradigma geométrico esculpida por seus mestres.
Mas fixemos nosso olhar para uma jurássica alcova romana, cuja assembléia desde patrícios eloqüentes e eruditos, tem o nome de Senado que, carinhosamente e veridicamente traz contemporaneamente o codinome que melhor lhe aprouve: “Psicopatolândia”. O viciado da Cracolândia é regido pelo capricho vicioso do sádico da Psicopatolândia que lhe aporrinha com seus devaneios radioativos. O jogador de futebol só quer jogar; o “dependente” químico só quer se ausentar.  O efeito do primeiro é em Euros; o do segundo é em neuro. Para o primeiro a Psicopatolândia atribuem louros e consentimentos morais e econômicos; para o segundo atribuem opressão e banimento. Como um viciado pode querer atestar uma moral a outro viciado e como um doente pode medicar outro doente? Acho que o conceito que imbuíram o (Vício) está ainda mascarando uma gama de psicopatas viciados no sadismo consciente sobre os pobres, os pretos, os índios e todos que são inferiorizados racialmente e economicamente por essa corja de “Condores” mascarados de herbívoros. Termina o pensador.
- o que a condor tem haver com os políticos? Pergunta.
- a Condor é uma ave falconiforme que se alimenta de carne em putrefação e seu vôo é o mais alto de todas as aves rapineiras; sua visão é super aguçada para detectar sua alimentação das alturas. O político é um animal bípede, cujo vôo intelectual é mais alto do que das suas presas que, ainda estão vivos – ou quase; do mais alto ele mergulha sobre suas presas e, com suas garras potentes e bico incisivo, começa a hecatombe desejada. Mas a única diferença entre esses dois animais é que o primeiro se alimenta por uma necessidade biológica imanente; o segundo por um capricho desatinado de um prazer viciado no sadismo e numa razão psicopática que se articula a mascarar-se de herbívoro para abater-nos. Termina o esboço analítico.
- acho que quem está abatido agora sou eu... que pesquisa desenrolou nas graduações! Responde Oluap desnorteado pela rajada de palavras.
- isso não tem haver com faculdades, diplomas, enciclopédias – embora sejam úteis, mas não detém esse tipo de conhecimento – mas um comprometimento com a harmonia da vida: essa é a graduação necessária; a outra apenas importante! Retruca.
- que tal livrarmo-nos dessa pesquisa estatal e dissimulada, cujo verdadeiro sentido é aprisionar-me no seu vício pérfido, e adentrarmos em um vício que possa ser compartilhado por nós? Pergunta Oluap.
- que tal uma caipirinha de cachaça do outro lado da Av. Ipiranga? Responde com outra pergunta.
- de certo estaremos nos viciando e não sendo viciados por perturbadores da anarquia humana! Conclui Oluap brindando com o copo de caipirinha.
Marcelo Mafra
Enviado por Marcelo Mafra em 11/12/2009
Reeditado em 26/12/2013
Código do texto: T1972705
Classificação de conteúdo: seguro

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