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segunda-feira, 2 de abril de 2018
domingo, 1 de abril de 2018
Entrevista com Gedeon Freire de Alencar PENTECOSTALISMO
https://pentecostalismo.wordpress.com/2009/06/17/entrevista-com-gedeon-freire-de-alencar/
Entrevista com Gedeon Freire de Alencar
Gedeon Freire de Alencar é presbítero da Igreja Assembléia de Deus Betesda em São Paulo, mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista, diretor pedagógico do Instituto Cristão de Estudos Contemporâneos (ICEC). É membro da Associação Brasileira de História da Religião, Associação de Professores de Missões do Brasil e da Rede de Teólogos e Cientistas Sociais do Pentecostalismo na América Latina e Caribe.
Alencar escreveu o livro de cunho sociológico Protestantismo Tupiniquim: Hipóteses Sobre a (não) Contribuição Evangélica à Cultura Brasileira (Arte Editorial). No ano 2000, em seu mestrado na Universidade Metodista defendeu a dissertação: Todo poder aos pastores, todo trabalho ao povo, e todo louvor a Deus. Assembléia de Deus: origem, implantação e militância (1911-1946). Nessa dissertação faz uma interessante análise da história assembleiana a em sua primeira fase no Brasil.
Nessa divertida entrevista discutiremos um pouco sobre o pentecostalismo (ou pentecostalismos) no Brasil.
Blog Teologia Pentecostal: Qual a importância da Assembléia de Deus para o pentecostalismo do século XXI? Essa denominação ainda consegue influenciar as tendências pentecostais no Brasil?
Blog Teologia Pentecostal: Qual a importância da Assembléia de Deus para o pentecostalismo do século XXI? Essa denominação ainda consegue influenciar as tendências pentecostais no Brasil?
Gedeon Alencar: A AD é o elemento principal do que eu chamado de ” matriz pentecostal brasileira” (aliás, isto é base de meu projeto de doutorado que não consegui, por diversas razões, levar adiante).
As duas primeiras igrejas pentecostais são AD e CCB. A Congregação, nas primeiras quatro décadas fundamentais para sua formação, é uma igreja étnica- isso não é dito com mérito ou demérito. Além de ser ultra calvinista (talvez mais que o próprio Calvino): se tornou uma igreja fechada. Note: não estou afirmando que isto é bom ou ruim; estou fazendo uma constatação histórica. Hoje ela é bem parecida com o que era há anos atrás. Não mudou quase nada do seu modelo original. Isso implica que, por seu isolamento social, não teve influencia na formulação do pentecostalismo brasileiro, e muito menos, na produção cultural do país.
Já a AD desde cedo se “abrasileirou”, apesar da liderança sueca. Desde os primeiros anos a liderança assembleiana foi tomada (e tomada mesmo…) por nordestinos. A convenção de 30, a primeira, é convocada por líderes nordestinos contra a vontade dos suecos. Não estou inventando nem interpretando, basta ler os registros no Jornal a Boa Semente publicados nos anos mais “quentes” de 28 a 30.
A AD posteriormente, brasileira, nordestina, pobre, simples, periférica, sem dinheiro e ligação com o exterior, que em vinte anos (não com muito dinheiro, TV e política na mão) alcança o Brasil – é uma igreja brasileira, feita por brasileiros, e para brasileiros!
Uma ultima coisa: todos os demais movimentos, denominações e instituições que se “pentecostalizaram” ou se “renovaram” têm, ou tiveram, alguma influencia do pentecostalismo assembleiano. O costume da saudação da “paz do Senhor”, o hinário, o modelo patrimonialista, usos e costumes, a ênfase evangelística, a dinâmica e participação do povo, etc., todas estas questões estão presentes em todos os movimentos pentecostais, por mais independentes que sejam, e são originados da “matriz pentecostal assembleiana”. A AD é que nunca conseguiu capitalizar em cima disso.
02. Em sua dissertação sobre a Assembléia de Deus, o senhor destaca um papel forte da missionária Frida Vingren, esposa do co-fundador Gunnar Vingren, nas importantes decisões eclesiásticas da nascente denominação. Frida Vingren, como mulher, poderia ser classificada com um fenômeno inédito no cenário evangélico brasileiro?
Frida Vingren é, a meu ver, a maior heroína assembleiana e, ao mesmo tempo, a maior injustiçada da história assembleiana. Só se fala em Gunnar Vingren e Daniel Berg – típico de uma historiografia machista. Em 1917, ela sai sozinha e solteira da Suécia, passa nos EUA e vem ao Brasil para casar com Vingren. Aqui canta, ora, prega, escreve mais de 80% do jornal (Boa Semente), faz culto nos presídios, na Central do Brasil, escreve música e poesia, organiza a Harpa, escreve Atas, enfim, dirige a igreja! Seu marido desde o primeiro mês no Brasil é um home doente de malária, é ela quem carrega o piano! É exatamente por isso que ela tem muitos inimigos – desde os cabras machos nordestinos que não querem ser liderados por uma mulher ao seu contemporâneo Samuel Nystron que é contra a liderança feminina. No livro ” História da Convenção”, publicado pela CPAD, o jornalista Silas Daniel, resgata algumas cartas nada amistosas que Nystron e Gunnar trocaram.
Não é inédito porque a religião, não somente o pentecostalismo brasileiro, sempre teve grandes mulheres, mas como sempre marginalizadas. Ainda hoje é assim. Tem uma tese na PUC sobre as mulheres que pentecostais que o titulo diz tudo; “O silencio que deve ser ouvido”. E um trabalho de missiologia da Laura de Aragão, no CEM, é outro primor: “Escolhidas por Deus, rejeitadas pelos homens”
03. Gunnar Vingren não viveu muito para ver o desenrolar de sua obra missionária. Na sua dissertação o senhor especula que a Assembléia de Deus talvez poderia ter tomado “outro rumo” com os Vingren por mais tempo na denominação. Qual seria esse “outro rumo”?
Amigo, eu sou sociólogo, não vidente…
Gunnar Vingren era formado em teologia pelo Seminário Teológico Sueco de Chicago, era a favor da mulher no ministério – sua mulher é a prova disso. Na década de 20, no RJ, consagra mulher ao diaconato. E em sua época, as mulheres participavam, não apenas ouvindo, mas falando e dando palpites nas reuniões da igreja. Em todas as fotos oficiais de convenção tem mulheres. Registra em seu diário que pregou na Congregação Cristã. E também nessa época tinha manifestações de “risos no Espírito” de forma que não podia continuar pregando – se isto tudo é erro ou acerto, isso não é problema meu. Mais uma vez um aviso: não estou inventando nem interpretando. Tudo está registrado em seu livro “Diário de um pioneiro” e no Jornal Boa Semente. Gunnar não era (como os demais suecos e toda a liderança assembleiana), contra o ensino teológico e formação em seminários teológicos; era a favor da mulher no ministério; era bem aberto as demais igrejas de sua época; e tinha um pentecostalismo bem “original”.
Ficou poucos anos da liderança, ademais era um homem doente, como ele mesmo diz “a igreja estar bem liderada por minha mulher e os obreiros”, quem liderava efetivamente era Frida. Levou um golpe da liderança nordestina da época em 1930, foi embora, e morreu logo em seguida. É laureado como herói atualmente, mas em vida foi voto vencido em todos seus projetos. A AD dirigida por Gunnar Vingren seria bem diferente da que se formou. Melhor ou pior? Não tenho a mínima idéia, mas diferente com certeza.
04. Por que a Assembléia de Deus adotou um discurso tão ultra-conservador nos usos e costumes? A origem marginalizada “sueca- nordestina” seria uma explicação satisfatória?
O “ethos sueco-nordestino” que Paul Freston desenvolve em sua tese, e eu repito na minha (o Freston foi meu orientador e depois participou da banca de minha defesa de mestrado), é uma das melhores explicações para isto, mas não é a única.
Não precisa recorrer a décadas de história, basta ver o presente. Onde e quais as igrejas (sejam ADs ou quaisquer outras) são conservadoras em usos e costumes? Apenas – veja, apenas – nas regiões pobres e mais periféricas. Igrejas em processo de “aburguesamento”, de classe média para cima não conseguem – ou não querem – ser conservadoras. Mesmo as ADs que falam tanto em “preservar a doutrina”, mas se preserva a “doutrina” apenas para os pobres e das igrejas nas periferias. Igrejas sedes e de classe média não tem “doutrina” que as segure. Portanto, neste processo a AD não estar sozinha; isso acontece, e aconteceu, com todas as demais igrejas. Mesmo que alguns queiram ligar o fato de “uso e costumes” a ação do Espírito Santo, lamento, mas isso diz respeito as questões econômicas.
05. Estudiosos como Bernardo Campos, Paul Freston e Robinson Cavalcanti defendem a tese que existe uma “pentecostalização” das igrejas históricas e uma “historização” das igrejas pentecostais clássicas ou de primeira onda. Quais são as implicações desse fenômeno para o mundo protestante?
Sim, isto é visível. O pentecostalismo, no Brasil, vai fazer cem anos, portanto, tem história. “Historizou-se”. O fenômeno religioso é dinâmico e, para mal ou bem, cíclico. Práticas religiosas que eram “pentecostais” anos passados ou décadas, se tradicionalizam. Ademais, se fala em pentecostalismo com fenômeno típico do século XX, mas muito disso já aconteceu em séculos passados nos Avivamentos, nos Movimentos de Santidade, na história de “santos” ou “hereges” medievais.
O mundo protestante vai sempre se “renovar” e/ou se “tradicionalizar” a despeito de todos.
06. Como sociólogo, quais aspectos do pentecostalismo ainda faltam ser explorados pelos estudos sociais, especialmente pela Ciência da Religião?
Temos muitos trabalhos hoje sobre o fenômeno pentecostal na atualidade, mas ainda falta uma delimitação da “matriz pentecostal” (daí meu projeto de doutorado). Agora o universo pentecostal hoje é tão amplo, plural, pitoresco e cheio de novidades que sempre haverá alguma coisa a ser explorada. Como brinco em sala de aula: O fenômeno religioso é tão original, que de tédio a gente não morre!
07. Como conhecedor do pentecostalismo latino, quais são as principais diferenças entres os pentecostais brasileiros e os demais carismáticos desse subcontinente?
Vou indicar apenas duas singularidades do pentecostalismo brasileiro. Em um congresso de sociologia na Costa Rica, tomei um susto quando conheci um pastor assembleiano peruano, um dos mais importantes, que era também o principal líder ecumênico em seu país. Assembleiano ecumênico é escasso no Brasil, mas não América Latina.
A AD, na América Latina, foi fundada e financiada pela AD nos EUA (diferente da AD no Brasil de origem sueca), portanto, a AD latina de fala espanhola é congregacional, como é a AD americana. Qual a AD brasileira é, estritamente falando, congregacional? Eu, particularmente, não conheço nenhuma.
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