Introdução
A indagação do título – nós
somos, isto é, a República Federativa do
Brasil é um Estado laico? –
parece primária. Um graduando aplicado que já tenha passado pelas aulas de
Teoria do Estado e Direito
Constitucional daria de pronto a
resposta: “Sem dúvida, somos um Estado laico.” Para comprovar sua resposta,
‘sacaria’ sua
Constituição e citaria o art. 19,
I, que veda aos entes públicos “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los,
embaraçar-lhes o funcionamento e manter com eles ou seus representantes
relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei a colaboração
de interesse público.”
Mas, para instaurar um pouco de
dúvida no referido aluno, perguntaríamos o porquê de os Constituintes invocarem
a proteção divina em seu preâmbulo: “Nós, representantes do povo brasileiro,
reunidos em Assembléia Nacional Constituinte [...] promulgamos, ‘sob a proteção
de
Deus’, a seguinte Constituição da
República Federativa do Brasil ” (grifo nosso).
E mais: o porquê da inserção, na
Seção destinada à Educação (Capítulo 3, Título 8), da seguinte norma no art.
210, § 1º.: “O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.”
Essa ambigüidade, constatável em
nosso texto maior, também é recorrente em nossa prática política e jurídica
cotidiana. É o que argutamente observou o jornalista Roberto Pompeu de Toledo,
na Revista
Veja (n. 1759, p. 114, 2002): o
Estado por aqui não tem religião. Mas tanto a Câmara quanto o Senado expõem um
crucifixo na parede atrás das respectivas mesas. Um candidato a presidente, por
mais ateu que seja, acaba rezando na campanha e comungando no exercício do
cargo, como se comprovou ainda há pouco.
E – característica não só
brasileira – decreta-se aqui feriado em dias de festas católicas. É verdade que
ficamos todos satisfeitos e corremos para a praia. Mas que têm a ver judeus e
muçulmanos, umbandistas, budistas e membros de outras comunidades religiosas
que convivem sob a jurisdição do Estado laico brasileiro com a sexta-feira ou o
dia de
Corpus Christi? 223 PRISMA JURÍDICO
Carlos José Teixeira de Toledo
http://www.redalyc.org/html/934/93400315/