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sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Priapismo

Vicari P et al Rev. bras. hematol. hemoter. 2007;29(3):275-278
Artigo / Article
Priapismo na doença falciforme
Sickle cell priapism
Perla Vicari1
Maria Stella Figueiredo2
Priapismo é a complicação relativamente freqüente na doença falciforme. Consiste de
ereção peniana prolongada e dolorosa, não acompanhada de desejo ou estímulo sexual,
usualmente persistente por mais de quatro horas. A disfunção erétil é seqüela
comum no tratamento inadequado. A forma típica de priapismo nestes pacientes é a de
baixo fluxo, ocorrendo, ainda, a forma de priapismo recorrente ou stuttering. O
tratamento inicial para esta complicação ainda não está bem estabelecido. São propostas
várias opções medicamentosas, tais como agonistas adrenérgicos, hormônios análogos
à gonadotrofina, dietil-estilbestrol, hidroxiuréia entre outras. Nos casos de falha
com as medidas conservadoras e medicamentosas, a intervenção cirúrgica, com confecção
de shunt cavernoso, é necessária. Este estudo revisa a incidência, patogênese e
opções terapêuticas desta complicação na doença falciforme. Rev. bras. hematol. hemoter.
2007;29(3):275-278.
Palavras-chave: Doença falciforme; priapismo; dietil-estibestrol; agonistas
adrenérgicos.
Instituição: Disciplina de Hematologia e Hemoterapia da Universidade Federal de Medicina – Escola Paulista de Medicina.
Correspondência: Perla Vicari
Disciplina de Hematologia e Hemoterapia – Unifesp/EPM.
Rua Botucatu, 740, 3º andar.
04023-000 – São Paulo-SP – Brasil
Tel.: (5511) 5576-4240 – Fax: (5511) 5571-8806
E-mail: perlavicari@hemato.epm.br
Priapismo é definido pela ereção peniana prolongada e
dolorosa não acompanhada de desejo ou estímulo sexual,
usualmente persistente por mais de quatro horas. Esta condição
é considerada uma emergência urológica e, infelizmente,
a disfunção erétil é seqüela comum no tratamento inadequado.
1
Classicamente, de acordo com o grau de oxigenação
sangüínea no corpo cavernoso, são descritos dois tipos de
priapismo: baixo fluxo (isquêmico) e alto fluxo (não isquêmico).
2 Inicialmente descrita por Diggs em 1934,3 a forma típica
de priapismo em pacientes portadores de doença falciforme
é a de baixo fluxo, podendo ocorrer de modo agudo ou recorrente
(stuttering).4 O priapismo recorrente é caracterizado
por episódios durante o sono onde não ocorre detumescência
ao acordar. Em geral, dura menos de três horas, não cursa
com dor intensa e tende a cessar espontaneamente. Entretanto,
quando ocorre repetidamente tende a interferir na qualidade
de vida do paciente.2
Na anemia falciforme, o priaprismo está associado com
baixo nível de hemoglobina e com alterações nos marcadores
de hemólise: contagem de reticulócitos, bilirrubinas, desidrogenase
lática e aspartato aminotransferase (AST). Além
disso, pacientes com priaprismo têm cinco vezes mais chance
de desenvolver hipertensão pulmonar.5
Incidência e prevalência
Estudos baseados em admissões hospitalares sugerem
uma prevalência de 2%-6% em pacientes falciformes. Entretanto,
dados retrospectivos mostram que cerca de 28% a
38% destes pacientes apresentam histórico de priapismo. A
idade média de acometimento é de 20 anos, sendo que o
primeiro episódio pode ocorrer ainda na primeira década de
vida.4
Patogênese
O mecanismo exato para a ocorrência de priapismo em
pacientes com doença falciforme ainda é pouco conhecido.
Durante a ereção ocorre relaxamento da musculatura lisa das
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Rev. bras. hematol. hemoter. 2007;29(3):275-278 Vicari P et al
artérias do corpo cavernoso, que está associado com aumento
do fluxo sangüíneo aferente e diminuição do eferente,
até que a pressão interna do corpo cavernoso aumente e o
fluxo aferente cesse. Persistência da ereção e falência da
detumescência estão associadas a aumento da hipóxia, elevação
da pressão CO2 e acidose. A baixa tensão de oxigênio
no corpo cavernoso predispõe à falcização, e os eritrócitos
falcizados, por sua vez, predispõem à estase venosa com
conseqüente estase e perpetuação do priapismo. Exames de
imagem demonstram que a estase resulta de obstrução das
veias dorsais penianas.2,4
Alterações estruturais na musculatura lisa peniana são
observadas após 12 horas de duração do priaprismo. Isquemia
prolongada está associada a edema tissular, necrose muscular
e reação inflamatória, cujo resultado final é fibrose trabecular
e provável disfunção erétil.2,4
Daley e colaboradores documentaram significante redução
na produção de prostaciclinas (PGI-2) durante a hipóxia
de células do corpo cavernoso em coelhos, a qual foi atribuída
à inibição da enzima PGI-2 sintetase.6 Adicionalmente, a
produção de óxido nítrico (NO) encontra-se afetada no corpo
cavernoso, pois a hipóxia reduz a atividade da NO sintetase.
A redução combinada da PGI-2 e NO, observada em
condições de hipóxia, favorece a agregação plaquetária e
adesão leucocitária, acarretando formação de trombo e lesão
tissular.1
Diagnóstico
A história clínica e o exame físico são mais do que suficientes
para o diagnóstico. A história ressalta os possíveis
fatores etiológicos e duração da isquemia. O exame revela a
gravidade da dor e rigidez peniana. É essencial para a descompressão
corpórea rápida que o priapismo de baixo fluxo
seja confirmado.2
O aspirado peniano de 5 ml de sangue pode estar associado
com o imediato alívio da dor e da detumescência. O
sangue aspirado, no baixo fluxo, é intensamente escuro e a
gasometria deste pode confirmar as condições de hipóxia.2
Tratamento
O tratamento inicial para esta complicação ainda não
está bem estabelecido (Tabela 1). Hidratação, estímulo da
micção, alcalinização, analgesia e resolução da ansiedade são
recomendados na terapêutica inicial do episódio agudo. Os
pacientes devem ser orientados a procurar o serviço de emergência
em casos que excedam duas horas de duração e a
avaliação urológica é recomendada.7
Terapêuticas conservadoras incluindo exercício, gelo e
ejaculação podem ser realizados antes de manobras intervencionistas,
as quais consistem inicialmente de aspiração
do corpo cavernoso e irrigação com soro fisiológico morno.1
Opções medicamentosas no tratamento do priapismo
têm sido amplamente estudadas, entretanto são poucos os
trabalhos randomizados com casuística significante.
Vários agonistas adrenérgicos foram testados incluindo
α-agonistas (metaraminol), associações α e β-agonistas
(epinefrina) e β-agonistas puros (terbutalina). Os agonistas
atuam como vasoconstritores induzindo a contração da musculatura
lisa das artérias do corpo cavernoso e forçando o
retorno sangüíneo para a circulação venosa. Por outro lado,
os β-agonistas agem bloqueando β-receptores, o que resulta
em relaxamento dos vasos, entrada de sangue oxigenado
no corpo cavernoso e diminuição de células falcizadas.
Assim, se após dez minutos de tratamento conservador
não ocorrer resolução do priapismo estão indicadas manobras
mais invasivas, utilizando-se drogas agonistas adrenérgicas.
A aspiração intracavernosa, seguida pela irrigação com
10 mL de solução de epinefrina (1:1.000.000), mostrou cerca
de 95% de eficácia em priapismos com mais de quatro horas
de evolução. Efeitos adversos podem ocorrer, tais como
taquicardia e hipertensão.8,9
A terbutalina, na dose de 5-10 mg, também pode ser
utilizada no priapismo agudo com índice de resposta de 36%.10
Os agonistas adrenérgicos também podem ser utilizados
na prevenção dos eventos recorrentes de priapismo agudo
ou stutterring na dose oral de 0,25mg/kg duas vezes por
dia por um mês (Tabela 2).
Tabela 1. Tratamento do priapismo agudo
Tempo de evolução Terapêutica
0 - 2 horas
Tratamento domiciliar: estimular micção,
aumentar a ingestão hídrica, exercícios e
analgesia oral
2 - 4 horas
Tratamento hospitalar: Hidratação intravenosa,
analgesia intravenosa, ansiolíticos e
oxigênio (quando necessário)
4 - <12 horas
Tratamento hospitalar: Manter hidratação,
analgesia e ansiolíticos. E realizar aspiração
intracavernosa de sangue e irrigação
com agonista adrenérgico (com anestesia
local). Repetir quando necessário.
> 12 horas (ou antes,
de acordo com
avaliação médica)
Tratamento hospitalar: Avaliação cirúrgica
para realização de comunicação venosa
(shunt)
Tabela 2. Prevenção do priapismo recorrente ou stuttering
Terapêutica * Medicamentos
Primeira linha Agonista adrenérgico oral
(pseudoefedrina)
Segunda linha -agonista oral (terbutalina)
Terceira linha Análogos hormonais
(leuprolide, flutamida)
Quarta linha Dietil-estilbestrol ou hidroxiuréia
* A melhor terapêutica varia de acordo com a faixa etária do
paciente e a presença de outras complicações decorrentes da
síndrome falciforme
β
277
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O uso da droga é relativamente seguro com a vantagem
de poder ser administrado oralmente. Entretanto, os relatos
prévios mostram melhor resposta em crianças do que em adultos.
11,12
Alternativas terapêuticas usadas com algum resultado
são os hormônios análogos à gonadotrofina, tais como
flutamida e leuprolide. Os efeitos adversos ao uso destas
medicações têm sido relatados em 2% dos pacientes pediátricos
e incluem reação no local da aplicação, dor generalizada,
eritrodermia e acne. Quanto à libido, estudos com estes
medicamentos contra o câncer de próstata mostram preservação
desta bem como da função erétil dos pacientes. Apesar
destes hormônios serem bem tolerados, na maioria dos
pacientes pediátricos pode levar à maturação sexual tardia,
devido à redução dos andrógenos circulantes e retorno dos
órgãos reprodutivos à fase prepuberal.13,14
O dietil-estilbestrol é um dos poucos agentes que possuem
sua eficácia comprovada através de estudos placebocontrolados.
15 O exato mecanismo de ação ainda é desconhecido;
entretanto, teorias sugerem a neutralização dos
hormônios masculinos e efeito direto nas características
eritrocitárias. A dose de 5 mg/dia de dietil-estilbestrol por
três a quatro dias pode abortar o priapismo recorrente em
cerca de 80% dos casos. Os efeitos colaterais observados
com o uso desta droga são: mastalgia e ginecomastia, náusea,
vômitos, cefaléia, edema, alterações da libido, hirsutismo
e atrofia testicular.
A hidroxiuréia também tem sido proposta no tratamento
do priapismo em pacientes falciformes devido à conseqüente
elevação da hemoglobina fetal, redução do neutrófilos
e reticulócitos e diminuição da adesão celular ao endotélio
vascular. Os efeitos adversos da hidroxiuréia incluem: mielossupressão,
elevação das enzimas hepáticas, sintomas
gastrointestinais, febre, edema, eritema e falência renal.16
Assim como o dietil-estilbestrol, os efeitos colaterais
da hidroxiuréia bem como a escassez de estudos em pacientes
menores de 18 anos impossibilita a escolha desta drogas
como terapêutica de primeira linha no priapismo infantil.
Outras drogas, tais como ketamina, hidralasina, bloqueadores
de canal de cálcio, hialuronidase e anticoagulantes,
também foram empregados no tratamento do priapismo
nas síndromes falciformes. Porém, a eficácia destes é questionada
devido à pouca comprovação na literatura.17
A transfusão de hemácias no tratamento do evento
agudo é controversa.18 Na presença de priapismo não responsivo
a manobras conservadoras ela pode ser indicada,
devendo sempre evitar a hiperviscosidade (hemoglobina
maior que 10 g/dL). A eritrocitoaferese, quando disponível,
pode manter a concentração de hemoglobina S abaixo de
50%, o que deve levar à diminuição da falcização.7
Nos casos de falha com as medidas conservadoras e
medicamentosas, a intervenção cirúrgica é necessária. Uma
grande variedade de técnicas tem sido descrita para a realização
de shunts venosos, incluindo shunts distais (Winter,
Ebbehoj), cavernoesponjosos (Quackels) e cavernofemoral
(Grayhack).1
Prognóstico
Cerca de 10%-30% dos pacientes evoluem com
disfunção erétil parcial ou total após o priapismo, independente
do tipo de terapêutica empregada. O tempo é o
determinante do prognóstico destes pacientes. Claramente,
no priapismo agudo em pacientes falciformes, a prevenção é
melhor do que a cura e a limitação da duração dos episódios
recorrentes é muito importante.
A intervenção precoce com aspiração e irrigação com
α-agonista mostrou ausência de disfunção erétil após quarenta
meses de seguimento.9
As evidências são conflitantes entre a eficácia terapêutica
conservadora e a cirúrgica no caso do priapismo agudo.
Estudos pregressos demonstram 94% de eficácia em manter
a função erétil dos pacientes sem cirurgia contra 58%
após cirurgia. Adicionalmente, este grupo cirúrgico apresentou
20% de incidência de complicações locais graves, tais
como: celulite, necrose de pele e peniana, fístula uretral e
abscesso. Na prática, é nítido que a cirurgia ainda é reservada
para os casos graves e prolongados, e é possível que a
disfunção erétil subseqüente esteja relacionada mais à duração
do quadro do que à intervenção cirúrgica.19
Abstract
Priapism is a common complication of sickle cell disease. It is defined
as a painful and persistent penil erection not accompanied by sexual
desire or stimulation, usually lasting for more than 4 hours. The
typical forms of priapism in sickle cell disease are low-flow and
recurrent priapism (stuttering). The first-line treatment for this
complication is not totally clear. Several treatments have been
proposed such as adrenergic agents, gonadotropin-releasing
hormone analogues, diethylstilbestrol, hydroxyurea. If conservative
treatments fail, surgical intervention is required with cavernous
shunts. This study reviewed the incidence, pathogenesis and
management of sickle cell priapism. Rev. bras. hematol. hemoter.
2007;29(3):275-278.
Key words: Sickle cell disease, priapism, diethylstilbestrol, adrenergic
agonists.
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O tema apresentado e o convite ao(s) autor(es) constam da pauta
elaborada pelo co-editor, prof. Rodolfo Delfini Cançado.
Avaliação: Co-editor e um revisor externo.
Publicado após revisão e concordância do editor.
Conflito de interesse: não declarado.
Recebido: 11/04/2007
Aceito: 17/05/2007

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